PPCI

Alteração na Lei Kiss – O que dizem o Corpo de Bombeiros, os profissionais e a sociedade

Foto: Arquivo / A Razão
Foto: Arquivo / A Razão

A recente aprovação do texto que altera a Lei nº 14.376 de 2013 – a Lei Kiss, que fixa normas sobre Segurança, Prevenção e Proteção Contra Incêndios nas edificações do Rio Grande do Sul – está sendo objeto de debate entre profissionais, arquitetos e urbanistas e engenheiros, sociedade civil, Corpo de Bombeiros e empresários gaúchos.

A Lei Kiss nasceu como uma resposta ao trágico incêndio na Boate Kiss em 2013 em Santa Maria, onde 242 pessoas, a maioria jovens, morreram. A principal motivação para a mudança é a dificuldade da emissão de alvarás, o que estaria criando um entrave para empreendedores gaúchos. Em três anos, inúmeros empreendimentos fecharam por falta de adequação à nova legislação.

Foto: Felipe Truda/G1
Foto: Felipe Truda / G1

Por 39 votos a um, o Projeto Lei Complementar nº 76 de 2016 foi aprovado na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Para alguns empresários, não é correto falar em “flexibilização”, mas em mudanças que diminuem a burocracia e permitem o cumprimento da lei sem prejudicar a segurança. Para representantes da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), está se criando cenário para novas tragédias.

Foto: Marcelo Bertani / Agência ALRS Divulgação
Foto: Marcelo Bertani / Agência ALRS Divulgação

Já para os arquitetos e urbanistas, outros pontos importantes também merecem destaque: simplificação do processo de análise e aprovação de Plano de Prevenção Contra Incêndios (PCCI) e Plano Simplificado de Proteção Contra Incêndio (PSPCI), alteração dos prazos de validade do Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (APPCI) e, principalmente, não obrigatoriedade de apresentação de Registro de Responsabilidade Técnica (RRT) ou Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) na renovação do alvará de planos simplificados de risco médio. Nesses casos, o autor do pedido de renovação será o responsável civil e criminal pelas informações prestadas aos Bombeiros.

Para a arquiteta e urbanista com especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho Lisiane Salaverry, uma das convidadas da 21ª edição do programa Uma Tarde no CAU/RS, “a Lei Complementar nº 76 de 2016 permite que edificações como clínicas, escolas, asilos, presídios, indústrias de pneus e até depósitos de papel e madeira sejam aprovadas sem necessariamente o acompanhamento de responsável técnico capacitado”. Destaca-se que profissional habilitado para elaborar um PPCI são tanto arquitetos e urbanistas quanto engenheiros.

A norma também exclui necessidade de PPCI para empreendimentos rurais, exceto silos e armazéns, que serão regulamentados pelo Conselho Estadual de Segurança, Proteção e Prevenção Contra Incêndio (COESPPCI). Outras mudanças na lei incluem:

  • Criação do Certificado de Licenciamento do Corpo de Bombeiros (CLCB) online para empreendimentos de baixo e médio risco de até 200m²;
  • Plano simplificado para edificações acima de 200m² até 750m² de risco baixo e médio, de acordo com os critérios estabelecidos, que poderá ser emitido pela internet e renovado por dois a cinco anos, dependendo do caso;
  • Inclusão das entidades Fetag, Farsul, Secretaria do Desenvolvimento Rural e Secretaria da Agricultura no COESPPCI. O número de conselheiros passa de 21 para 25. Clique aqui e confira as demais entidades que integram o referido Conselho.

Também contribuíram com a última edição do Uma Tarde no CAU/RS a conselheira Rosana Oppitz, o engenheiro civil e de segurança do trabalho João Daniel Xavier Nunes e o Major Estevam do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul.

O Major reforçou o enunciado da lei de que alega não haver necessidade de apresentação de RRT ou ART na renovação no processo simplificado de risco médio, mas que isso não significa que o Estado não poderá cobrar pelo Registro ou Anotação. “A simplificação é processual, não técnica”, concluiu. Caberia a cada um dos Conselhos de Fiscalização Profissional – CAU e CREA – incentivar a contratação de seus profissionais.

Lisiane alegou que a legislação sobre Planos de Prevenção e Proteção Contra Incêndios é uma “colcha de retalhos” que prejudica o trabalho do profissional*, o que demanda um aumento muito grande de sua responsabilidade, segundo João Daniel. Outro assunto abordado foi a demora no encaminhamento, análise e vistoria do PPCI, muito em função das mudanças que ocorrem com frequência nas normas de Segurança Contra Incêndio.

21ª edição do Uma Tarde no CAU/RS
21ª edição do Uma Tarde no CAU/RS

De modo geral, profissionais e sociedade acreditam que os gaúchos continuarão expostos a situações de risco que poderiam ser evitadas através de normas e legislações. As regras atuais, com todos os seus adendos, abrem possibilidades de interpretação que podem, no limite, reduzir as medidas de prevenção. As constantes mudanças impedem um entendimento pleno e estável daquilo que se deseja, tanto por profissionais quanto por responsáveis pelas edificações. “A sensação é que, passados quase três anos da tragédia da Kiss, não há padrão nas revisadas regras para Segurança Contra Incêndio e que continuamos sem conseguir obter algo que atenda minimamente os desejos e exigências de todas as partes interessadas”, finaliza Lisiane.

A conselheira Rosana Oppitz colocou que a pauta também será debatida na Comissão de Exercício Profissional do CAU/RS para verificar o que o Conselho – enquanto órgão de fiscalização profissional – pode articular junto às demais instituições públicas após essas novas alterações na Lei Kiss. Confira o áudio completo da 21ª edição do Uma Tarde no CAU/RS abaixo.

*Confira a lista de normas sobre Segurança Contra Incêndio na aba relacionada no site do Corpo de Bombeiros.

Leia mais

CAU/RS elabora enquete para consultar profissionais sobre atuação em Projetos de Prevenção e Combate a Incêndio

Ouça | 21ª edição | 14/08/2016

Uma Tarde no CAU/RS

  • Quarta-feira, ao vivo, das 15h30 às 17h
  • Transmissão: Rádio Arquitetura, a rádio das mentes criativas
  • WhatsApp: (51) 8211-9741

8 respostas

  1. Os profissionais que trabalham na área de prevenção contra incêndio acreditam que após a aprovação da LC 76/2016, a população do Estado do RS continuará exposta à situações de risco que poderiam ser evitadas através da legislação e normas. As regras atuais, com todos os seus “adendos”, abrem uma grande possibilidade de interpretações que podem – no limite – reduzir as medidas de prevenção. As constantes mudanças ocorridas impedem um entendimento pleno e estável daquilo que se deseja, tanto pelos profissionais quanto pelos responsáveis das edificações. A sensação é que, passados cerca de 3 anos da tragédia da boate Kiss, não há padrão nas revisadas regras para prevenção contra incêndio, e que continuamos sem conseguir obter algo que atenda minimamente os desejos e exigências de todas as partes interessadas.

  2. Me chamo Priscila, sou arquiteta urbanista, especializada em segurança do trabalho, atualmente trabalhando com o eng. Alexandre Rava de Campos, de grande atuação na área da prevenção e combate a incêndio no Estado do Rio Grande do Sul. Estamos todos atuando fortemente junto de todas as entidades de classe (engenheiros e arquitetos) buscando desfazer todos estes passos equivocados aqui relacionados. Somente com a união conseguiremos obter resultados que possam garantir a segurança da sociedade gaúcha.

  3. Devo ao comentar,neste espaço,ser ético,e equilibrado(pelas várias interfaces do tema),portanto gostaria de iniciar citando algo real, qual seja : …resido e atuo hoje em Capão da Canoa, mas mantenho minha atividade em POA.
    A planta imobiliária de Capão da canoa foi alterada de um pavimento, para 12 pavimentos.O Corpo de Bombeiros, não possui uma unidade com “escada Magyrus”.
    Observo deste modo prático e realista, de que o espaço entre a “VIDA”,e a fatalidade que ocorre pela não presença do ESTADO(municípal,estadual,federal), é algo sem palavras.
    Verifico na lei 14376/13, uma forte presença da legislação vigente no Estado de São Paulo, pergunto então, será que lá os fatos ocorridos, foram suficientes,para que a legislação esteja em vigor e na plenitude da sua execução e fiscalização?
    O que há,neste impasse legal,sou favorável a emancipação do Corpo de Bombeiros da BM, mas este é um fator da logística de segurança,no meu entender o que deve estar acima de qualquer dado, é a falta de entendimento entre as partes envolvidas, e a atribuição de responsabilidades.
    Ora, é simples, vamos comparar por exemplo,o Código de Obras(L.C 284/92), é uma lei municipal em vigor, totalmente superada pelo tempo, havendo comissão para sua atualização e melhoria a mais de 15 anos na SMOV, mas segue sendo um balizamento legal,e os responsáveis técnicos,pelos Projetos de Arquitetura são os mesmos, que devem se responsabilizar pelos assuntos de prevenção e proteção aos riscos de incêndio.
    Ou seja, como dissociar, autor e obra, é evidente que atuar em conjunto com uma equipe multidisciplinar, onde a prevenção deve ter a mesma importância dos demais projetos,mas a luz de uma legislação enxuta,objetiva,responsável,atualizada,e que permita ao autor do projeto,assumir plena responsabilidade, assim como por exemplo, quanto ao ítem da acessibilidade,onde ao emitirmos a RRT, já optamos em respeitar, por levar a sério este requisito social,tanto quanto deveria ser na parte de prevenção e proteção contra incêndios e correlatos.Quanto mais complexa,a lei ficar,mais problemas trará para todos, em outros países será que este assunto, não poderia nos ajudar a colocar um ponto final.
    Todos assinam e são solidários perante a lei, desde o proprietário, até os autores dos demais projetos envolvidos, visto que de certo modo um “projeto”, é “uma máquina de morar”(Le Corbusier), ou seja tudo deve funcionar.
    Dividir as responsabilidades,não exime ninguém de sua responsabilidade quando em conjunto com os demais profissionais,em um projeto de segurança.Todos o são perante a lei da VIDA.
    A agilidade nesta matéria,é fundamental, quando da vigência da L.C.420/98,havia bom entendimento legal.
    Desculpem-me os colegas, mas temos que salvar vidas sempre.

  4. Mais uma vez o o CAU/CREA assistem de braços cruzados a lei que torna um leigo em um técnico, um soldado em um Engenheiro ou Arquiteto, pois a formação de quem examina os projetos e ZERO, pois segurar mangueira para apagar incêndio, não torna o mesmo um técnico, mesmos os oficiais sua formação e para a área legal, enfermeira mesmo vendo todo o dia doentes não vira médica, com a entidade de classe dos médicos a atuante, não prospera tal disparate.
    Porque o CAU não entra no poder na justiça para resolver tal impasse, porque e como não brigar com os
    colegas de entidades públicas, para resolver o problema de um projeto de proteção contra incêndio demorar para ser analisado demorar 4 s 5 meses para ser aprovado ( REPRESANDO OBRAS E ESTABELECIMENTOS DE OPERAR) não tem problema, sendo necessário pagar mais duas taxas de vistoria porque quem vistoria não aceita o projeto aprovado pelo colega.
    Agora contrata aluno para fazer a parte de profissionais habilitados para fingir que esta tirando o bode da sala, VIVA A TAXA DE APROVAÇÃO E VISTORIA, para pintar e manter suas unidades e climatizar todas as suas unidades o equipo sucatas, hidrantes sucatas.
    A BM acabou com a parte de engenheiros e Arquitetos pois agora por lei torna soldado em profissionais com curso superior .
    Mais a festa continua

  5. Se o CAU aceitar que documentos técnicos sejam elaborados por leigos, estará abdicando de cumprir sua função mais importante que é fiscalizar o exercício profissional, com base na lei que regulamenta o exercício da arquitetura no país.
    seria a negação do seu papel de defensor da sociedade e valorização de uma das atividades do profissional arquiteto.

  6. Acho que a lei deve ser bastante rígida e sua fiscalização, o principal, mais rigorosa ainda.
    É importante agilizar e desburocratizar os processos, mas
    nada que coloque em risco o
    cumprimento rigoroso das normas
    exigidas para cada estabelecimento.
    O PPCI é tão importante qt. a estrutura da edificação. Deve-se exigir o máximo.

  7. Não esqueçamos de que a aplicabilidade da lei é genuína, por vezes sem efeito, visto a possibilidade de inviabilidade técnica, o que deverá de ser interpretado pelo profissional.
    A garantia da vida é inegável, porém, as condição física do edilício é um fator determinante do projeto.

  8. A grande maioria dos prédios de Porto Alegre (90%) tem 4 pavimentos,até 12 metros. Isto pq este é o máximo para dispensa de elevador. Daí vem os bombeiros com a norma que prédios residenciais com mais de 3 pavimentos exigem um processo complicado com ART, contratação de profissionais, demora anos … mas se for menos de 4 pavimentos, é fácil e sem exigências absurdas.
    É ou não é sacanagem?

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